quarta-feira, 24 de julho de 2013

Um certo olhar e escutar da psicodermatologia

                                
Hipócrates, pai da medicina, teve uma visão integrativa. Introduziu a ideia de que o corpo humano  é um todo cujas partes se interpenetram e a alma,elemento interno dessa coesão,teria uma função reguladora . Ele se preocupou com as doenças fisicas e os problemas mentais de seus pacientes e considerava o cérebro o órgão do pensamento.Tinha ao mesmo tempo uma visão humanista e cientifica da medicina.
 
De acordo com o texto “A cura” de D. W. Winnicott, a palavra “cura’’ foi perdendo através dos séculos o seu significado original que era “cuidar” e passou a ter o significado de um tratamento médico  com  um “desfecho bem sucedido”, isto é, um tratamento médico que traria como resultado a destruição ou erradicação da doença e suas causas.Neste texto,  o autor  mostra que na doença há uma relação de confiabilidade entre as partes, entre médico e paciente, e essa relação leva ao processo de se deixar cuidar.
 
Os pacientes, há algum tempo, percebem os médicos um tanto distanciados, demonstram uma insatisfação da falta de vinculo com esses  profissionais. As consultas são rápidas e muitas vezes os pacientes apresentam a queixa recorrente que o médico, no caso o dermatologista, prescreveu o medicamento mas não examinou a pele.
 
Hoje a medicina  já admite com mais facilidade a visão hipocrática da relação integrada corpo e mente.
 
Observamos que apenas a abordagem dermatológica não é suficiente para tratar muitos pacientes.Alguns sofrem tanto com as  suas patologias de pele,que um apoio psicológico se faz necessário. A consulta com enfoque psicodermatológico deve ser mais longa e a questão psicológica e dermatógica devem caminhar juntas.
 
O dermatologista pode se aprofundar nessa questão , estudando e aprimorando a sua formação na área psicológica,psiquiátrica ou psicossomática,ou adicionando na consulta técnicas e instrumentos que podem levar a uma melhora da eficácia do atendimento, podendo ou não encaminhar o paciente para outro profissional.
 
Muitos pacientes não estão cientes de seus problemas psicológicos e cabe ao dermatologista investigar muitas questões e observar se o paciente está deprimido, ansioso, se existe algum risco de violência,psicoses,dependêcias em geral, se ele está num período de tristeza , luto, stress.
 
De acordo com a Dra Françoise Poot podemos utilizar as seguintes ferramentas durante a consulta:
1 - Observação clínica: como o paciente se comporta, sua fala, sua comunicação não verbal,sua postura na cadeira, se ele estiver acompanhado pela familia, quem fala primeiro.
2 - Percepção e sentimentos do dermatologista: a atmosfera da consulta, se o paciente se mostra aberto, fechado, se apresenta uma pseudo-harmonia, tensões ocultas.Alguns pacientes psicóticos podem ter uma conversa aparentemente normal, mas com senso de irrealidade.
3 - Investigação: sobre a sua qualidade de vida, atividade física, alterações de humor, sono, apetite, ganho ou perda de peso.
4 - Uso de questionarios: são especificos para identificação e estudos de casos. São muito usados em estudos científicos, mas devem ser validados na lingua do país.
5 - Uso do Genograma:  realizado juntamente com o paciente, desenhando e escrevendo sua arvore genealógica com as patologias e eventos na família, como mortes repentinas, histórias de vícios, alcoolismo, eventos difíceis (separações,mudanças,perdas).
Todo esse processo de investigação na consulta auxilia o médico a acessar as emoções do paciente e juntos podem reconhecer, trabalhar e resolver muitas vezes o sintoma. É uma forma do paciente compreender a sua patologia.
Se o dermatologista não se sentir confortável com algumas questões ou perguntas mais íntimas, ele não deve julgar o paciente e nem entrar em confronto. O simples fato de  fazer algumas perguntas casuais ao paciente, por exemplo, como está sendo o seu dia e como o sintoma ou a patologia o está afetando emocionalmente, já é um passo para esse olhar e escutar da psicodermatologia.
 
Noemi  E. de Weber Wahrhaftig
 
Dermatologista em especialização em psicossomática
 
Psicanalítica no Instituto Sedes Sapientiae